“Alfred Adler foi o fundador do sistema holístico da psicologia individual, que enfatiza uma abordagem na qual compreende cada pessoa como uma totalidade integrada dentro de um sistema social. Seus seguidores fundaram centros na Europa, Inglaterra e Estados Unidos, e muitas de suas ideias originais tornaram-se, hoje, amplamente aceitas na Psicologia e Psicoterapia. Os mais importantes princípios de Adler são: o holismo, unidade do estilo de vida do indivíduo, o interesse social* ou sentimento de comunidade e a existência de comportamentos dirigidos para um objetivo. Adler argumentava que os objetivos e expectativas tem maior influência no comportamento que as experiencias passadas, e acreditava que todo mundo e motivado principalmente pelo objetivo de superioridade ou conquista do meio. Ele também enfatizava o efeito das influencias sociais em cada indivíduo e a importância do interesse social: um senso de comunidade, cooperação e preocupação com os outros.”
A TEORIA EM PRIMEIRA MÃO
O seguinte trecho fornece um exemplo dos métodos analíticos de Adler. Ele discute a importância teórica das primeiras recordações e depois monstra sua técnica para analisá-las.
As primeiras recordações têm um significado especial. Para começar, elas mostram o estilo de vida em suas origens e em suas expressões mais simples. A partir delas podemos avaliar se a criança foi mimada ou rejeitada; até que ponto ela treinou a cooperação com outros; com quem preferia cooperar; que problemas enfrentou e como lutou contra eles. Nas primeiras recordações de uma criança que teve dificuldades de visão e que treinava olhar mais acuradamente, encontraremos impressões de natureza visual. Suas recordações começarão assim : “Olhei à minha volta . . .”, ou descreverá cores e formas. Uma criança que teve dificuldades de movimento, que queria andar ou correr ou pular, demonstrará esses interesses em suas recordações. Episódios de infância relembrados devem estar muito próximas do interesse principal do indivíduo, e se conhecermos seu interesse principal conheceremos seu objetivo e seu estilo de vida. É este fato que torna as primeiras impressões tão valiosas em orientação vocacional. Podemos descobrir, além disso, as relações da criança com sua mãe, seu pai ou outros membros da família. É relativamente indiferente o fato das recordações serem precisas ou não; o mais importante é que representam o julgamento do indivíduo. “Desde a infância eu fui uma pessoa assim ou assado” , ou “Desde a infância eu considerava o mundo desta forma”.
O mais esclarecedor de tudo é a forma como o indivíduo inicia sua história, o primeiro incidente do qual ele pode recordar. A primeira lembrança mostrará a visão de vida fundamental do indivíduo; a primeira cristalização satisfatória de sua atitude. Isto nos dá a oportunidade de ver, num relance, o que ele tomou como ponto de partida para seu desenvolvimento. Eu nunca investigaria uma personalidade sem procurar a primeira recordação. Algumas vezes, as pessoas não respondem ou afirmam não saber que episódio aconteceu em primeiro lugar, mas isto, em si mesmo, é revelador. Podemos inferir que elas não querem discutir seu significado fundamental e que não estão preparadas para cooperação. Em geral, as pessoas estão perfeitamente dispostas a discutir suas primeiras recordações. Tomam-nas como meros fatos e não se dão conta do significado nelas escondido. É raro que alguém compreenda uma primeira recordação; por isso a maioria das pessoas é capaz de revelar seu propósito de vida, seu relacionamento com os outros e sua visão do meio ambiente, de um modo perfeitamente neutro e desembaraçado, através de suas primeiras recordações. Outro ponto de interesse, nas primeiras lembranças, é que sua síntese e simplicidade nos permite usá-las em investigações de massa. Podemos pedir a alunos de uma classe que escrevam suas recordações mais antigas e, se soubermos interpretá-las, teremos um quadro extremamente valioso de cada criança.
A título de ilustração, deixem-me apresentar algumas primeiras recordações e tentar interpretá-las. (Adler fez com que certos membros da plateia escrevessem suas primeiras recordações em pedaços de papel e lhe entregassem.) Eu não sei nada sobre os indivíduos além das recordações contidas nestes papéis, nem mesmo se são crianças ou adultos. 0 significado que encontramos em suas primeiras lembranças deveria ser confirmado por outras expressões de sua personalidade; mas podemos usá-las enquanto treino do aguçamento de nossa capacidade de adivinhar. Sabemos o que poderia ser verdadeiro e seremos capazes de comparar uma lembrança com outra. Particularmente, seremos capazes de ver se o indivíduo se educa em direção à cooperação ou contra ela, se tem ânimo ou é desanimado, se deseja ser apoiado e assistido ou ser autoconfiante e independente; se está preparado para dar ou ansioso somente em receber.
1. “Visto que minha irmã… É importante observar quais pessoas do meio aparecem nas primeiras lembranças. Quando aparece uma irmã, podemos ter quase certeza de que o indivíduo sofreu muito sua influência. A irmã lançou uma sombra sobre o desenvolvimento da outra criança. Geralmente encontramos uma rivalidade entre as duas, como se estivessem competindo numa corrida; e podemos entender que tal rivalidade oferece dificuldades adicionais para o desenvolvimento. Quando uma criança está preocupada com rivalidade, ela não pode estender aos outros seu interesse tão bem quanto o faz quando é capaz de cooperar em termos de amizade. Contudo, não nos apressaremos em tirar conclusões: talvez as duas crianças tenham sido boas amigas.
“Visto que minha irmã e eu éramos as mais novas da família, não me foi permitido frequentar a escola até que ela não tivesse idade suficiente para ir. ”Agora a rivalidade torna-se evidente. Minha irmã me atrapalhou! Ela era mais nova mas eu fui forçada a esperar por ela! Ela restringiu minhas possibilidades! Se este for realmente o significado da recordação, deveríamos esperar que essa menina ou menino sinta-se assim: “O maior perigo na minha vida e quando alguém me restringe e impede meu livre desenvolvimento”. É provável que o escritor seja uma moça. Parece haver menor probabilidade de que um garoto tenha sido detido até que uma irmã mais nova tivesse idade para ir para a escola.
“Conseqüentemente, começamos no mesmo dia.” Não devemos dizer que esta seja a melhor forma de educação para uma menina em tal situação. Podemos dar-lhe a impressão de que, por ser mais velha, deve ficar atrás. Em todo caso, vemos que esta determinada menina interpretou o fato neste sentido. Ela se sente preferida em favor de sua irmã. Acusará alguém desta rejeição, e este alguém será provavelmente sua mãe. Não ficaríamos surpresos se ela se inclinasse mais para seu pai e tentasse tornar-se sua predileta.
“Lembro claramente que mamãe contou a todo mundo como ela se sentiu sozinha em nosso primeiro dia de aula. Ela disse: ‘Eu corri ao portão muitas vezes nesta tarde e procurei as meninas. Realmente pensei que elas jamais chegassem’.” Aqui está uma descrição da mãe, descrição esta que não a apresenta comportando-se de modo muito inteligente. É o retrato que a menina faz de sua mãe. “Pensou que jamais chegássemos” – a mãe era-lhes obviamente afeiçoada e as meninas conheciam sua afeição; mas, ao mesmo tempo, era ansiosa e tensa. Se pudéssemos falar com esta moça, ela poderia contar-nos mais a respeito da preferência de sua mãe pela irmã mais nova. Tal preferência não nos surpreenderia, pois a criança mais nova e quase sempre mimada. Do todo desta primeira recordação eu concluiria que a mais velha das duas irmãs sentiu-se prejudicada pela rivalidade com a mais nova. Em sua vida futura, deveríamos encontrar marcas de ciúme e medo de competição. Não nos surpreenderíamos de encontrá-la antipatizando com mulheres mais novas do que ela. Algumas pessoas sentem-se demasiado velhas por toda sua vida, e muitas mulheres ciumentas sentem-se inferiores em relação a membros de seu próprio sexo que são mais jovens do que elas (ADLER, 1931, p. 74-78).
FADIMAN, James; FRAGER, Robert. Teorias da Personalidade. São Paulo: HARBRA, 1986.